Se alguém souber, peço encarecidamente que me informe o nome e o
endereço eletrônico do pândego que colocou na velhice o apelido de “melhor idade”.
Não lhe quero tomar satisfações, mas acho que seria no mínimo interessante, através de
uma simples conversa, procurar saber quais foram os elementos por ele utilizados para
chegar à desatinada conclusão. Gostaria de lhe perguntar, por exemplo, se ele acha
bonito o gradativo e inexorável esmaecimento da libido e da potência sexual. Há de ser
estarrecedor vê-lo explicando que isso é melhor do que o tesão dos vinte e cinco anos,
quando um simples pensamento é capaz de obrar milagres, sem que nem se cogite do
uso de pílulas azuis ou vermelhas de discutível eficiência.
Por certo ouvirei o argumento embasado na utópica “sabedoria” da “mãe
natureza”, ao fito de me convencer de que ela é capaz dispor as coisas segundo o que é
mais conveniente para cada idade. Ainda que tivesse alguma procedência essa conversa
fiada (e não tem nenhuma), haveria uma tergiversação nos rumos da conversa, já que a
questão em foco seria uma comparação qualitativa entre as várias épocas. Afinal de
contas, foi ele, o nosso pândego, que usou o adjetivo “melhor”, o que me daria o
indiscutível direito de exigir que ele se enquadrasse nas regras do jogo por ele mesmo
escolhidas e ditadas.
Ficaríamos, então, cingidos a limites bem claros: ele, cuja idade
desconheço, obrigado a demonstrar que a velhice é melhor que a juventude e eu,
indiscutivelmente velho, tentando estabelecer que essa é uma das mentiras mais
deslavadas que já se espalharam por este mundo deste os tempos de Neandertal.
“Tens a experiência de que os jovens não dispõem”, diria o meu
interlocutor, usando uma expressão retórica e para causar efeito. E eu seria obrigado a
lhe responder: grande coisa! De que me adianta toda essa experiência se uma das
certezas dela decorrentes é de que a indesejável morte está cada vez mais próxima? Na
juventude, a morte é quase uma ficção. Possível, mas improvável, de tal maneira que
não existe ser humano capaz de aceitar placidamente a extinção de uma vida nos seus
albores. Já na velhice… tenha a santa paciência.
Pior do que isso: o tema, apesar de macabro, ainda se presta a galhofas.
Quem ainda não ouviu dizer de determinado ancião que ele está fazendo hora extra? E
sem a remuneração adequada, principalmente se ele for aposentado pelo INSS, quando,
então, aliam-se a fome e a vontade de comer, numa sinistra orquestração da velhice
desamparada. Ainda: proclama-se à boca pequena que o IBGE já estabeleceu
estatisticamente que as mais frequentes causas de falecimento entre os velhos são
pneumonia, queda e mulher nova. Não necessariamente nessa ordem, o que permite aos
velhinhos mais salientes torcer para que o desenlace venha a ocorrer pela incidência da
terceira das causas citadas. Não manifesto aqui minha preferência; seria dar confiança
demais para essa tal de morte; mas sou obrigado a reconhecer que, diante da quase
vulgaridade das duas outras, a terceira opção preserva, digamos assim, um charme.
Já ouço a censura: você está conduzindo a matéria a partir de uma
perspectiva machista, uma vez que só se tem preocupado com a comparação entre
rapazes e velhos. Mas, meus caros, seria diferente entre as mulheres? Algo me diz que
não. Ainda outro dia vi um retrato de corpo inteiro da Brigitte Bardot! Foto recente. Só
mesmo quem estiver necessitando de uma consulta com o ectoplasma do doutor Rogélio
Casado pode achar que aquilo que a revista estampava é melhor do que o monumento
cinematográfico exibido em “Et Dieu créa la femme”.
Agora já não escapo da fúria das feministas e do politicamente correto:
quer dizer, então, que, quando se trata de mulheres, o que importa é só o aspecto físico,
a beleza e outras trivialidades? Nunca disse isso. Nem pensei. Entretanto, trago como
minha testemunha ninguém menos que o poeta Vinicius de Moraes, para quem “beleza
é fundamental”, afirmativa que se seguiu a um pedido desculpas às “muito feias”.
Mas não vou dar confiança para essas abordagens paralelas. Importa é
saber quem, no final da tertúlia, levou os louros da vitória: o meu adversário ou eu.
Cuido que o júri do bom senso me compensaria do esforço, proclamando o seguinte
veredito: uma ova que a velhice é a melhor idade. Nem com boa vontade.
P. S. – Esta crônica é dedicada ao meu amigo e irmão Alfredo Moacyr Cabral que,
velho como eu, sofreu recentemente uma séria ameaça de morte: caiu no banheiro e
fraturou o fêmur direito. Ó Alfredo, por que não experimentaste a terceira opção?